Corte em doações para entidades que distribuem cestas gera ‘rodízio’ entre famílias de Campinas; veja relatos

Campinas e Região



Líder comunitário no Jardim Rosália diz que precisa escolher mensalmente qual grupo vai receber os alimentos. Em setembro, o estudo colocou o valor da cesta na metrópole entre as mais caras. Instituições de Campinas relatam queda nos números de doações de alimentos neste mês O aumento sucessivo nos preços dos alimentos repercutiu no corte de até 90% em doações recebidas por entidades que distribuem cestas básicas para famílias em situação de vulnerabilidade social em Campinas (SP), segundo indicadores das próprias instituições. Com isso, os grupos mais sensíveis às mudanças relatam sofrimento e “rodízio” mensal até entre quem recebe e os que precisam esperar. Leite é luxo No Jardim Rosália, as 350 cestas avançadas durante o período mais crítico da pandemia de Covid-19 diminuíram para 35. Diante desta situação, a líder comunitária Ana Paula Fernandes diz precisa escolher as famílias que recebem as doações: “É uma angústia muito grande no coração olhar para uma família e dizer: ‘Esse mês você vai receber, mês que vem eu vou contemplar outra família'”, falou. Segundo ela, grande parte das doações vão para mães com crianças. É o caso de Maria Noélia Côrrea, mãe de quatro filhos. Um deles foi planejado com desnutrição e o leite é visto como item de luxo. “Meus filhos acordam de manhã e falam: ‘Mãe, me dá o que comer?’ E eu não tenho. Eu tenho que colocar um sorriso no rosto, levantar a cabeça, e falar: ‘Deus, o que eu vou fazer?’. Uns falam pra mim: ‘Mãe, já to cansado de comer fubá, faz um bolinho pra mim?’. ‘Mãe, tô cansado de comer farinha de trigo, compra um pão na padaria? E eu não tenho”, lamentou. A garçonete Natália dos Santos e a dona de casa Maria Noélia Côrrea com os filhos no Jardim Rosália Reprodução/EPTV Ela e o marido são desempregados e dependem das doações para sobreviver. Mas eles não são os únicos: nas casas próximas a história se repete e no bairro são 102 famílias em situação vulnerável. A garçonete Natália dos Santos mostrou à EPTV, afiliada da TV Globo, o que havia na casa para ela e os dois filhos nesta semana: meio pote de arroz e fim de uma garrafa de óleo. “A gente precisa que alguém aqui venha ajudar a gente, a gente está esquecido. A gente precisa ajudar o próximo”, alertou. A garçonete Natália dos Santos mostra alimentos que tem na casa da família Reprodução/EPTV Na estante da casa do soldado Paulo Rodrigues Moraes, uma geladeira quebrada virou uma dispensa onde ele guarda arroz, feijão, sal e fubá. Às vezes, é a solidariedade dos vizinhos, que guardou o alimento já reduzido, que garantiu uma refeição. “Tem dias que passo fome, passo apertado”, afirmou. Geladeira quebrada virou dispensa na casa de Paulo Rodrigues Moraes Reprodução/EPTV Outros exemplos No kartódromo do Taquaral, as mesas do projeto Bancada Solidária estão vazias. A iniciativa, que atende 56 instituições, fez apenas uma entrega na primeira semana de novembro por causa da queda drástica de doações. “Não tem o que fazer, a gente parou a entrega esse mês […] A gente tá pedindo pelo amor de Deus: se cada família, cada casa doar 1 kg de alimento, a gente já vai conseguir, em dezembro, dar as nossas 1 mil cestas básicas”, apelou a voluntária Vera Fuzaro. Alimentos doados para o projeto Bancada Solidária, no Taquaral, em Campinas Reprodução/EPTV Os números se repetem em outros espaços: a Central Única das Favelas (Cufa) e a Casa da Sopa Dona Benedita também anunciaram corte de até 90% nas doações. A ONG do Grupo Primavera, responsável por atender pelo menos 500 crianças e adolescentes com idades entre 6 a 18 anos, informou que as 250 doações de cestas básicas realizadas mensalmente virarão apenas dez. Com a redução, a entidade destacou que foi necessário priorizar a doação para mães solteiras. O projeto oferece atividades educativas e artísticas fora do período escolar, e garante três refeições treinadas para os atendidos, mesmo no período de férias. Segundo os responsáveis ​​pelas iniciativas, as quedas ocorrem porque os alimentos continuam a ter preços elevados. Além disso, elas avaliaram que houve menos adesão de parte da população que auxiliava com doações após redução de indicadores da crise sanitária, em relação ao período crítico. Aumento dos preços Em setembro, o Observatório PUC-Campinas pesquisou, pela primeira vez, os valores da cesta básica na metrópole. À época, o preço ficou em R$ 688,74, mas, um mês depois, subiu para R$ R$ 712,12. O salário mínimo necessário para custear os gastos com alimentação de uma família composta por duas crianças adultas e duas crianças seria de R$ 2.136,37, em meio à sombra. O valor é 76,2% maior que o mínimo brasileiro, fixado este ano em R$ 1.212. De acordo com dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o preço da cesta básica em Campinas é mais caro do que em 12 de 17 capitais brasileiras. A cidade com o maior preço é Porto Alegre (RS), onde o valor em outubro foi de R$ 768,82. Já a mais barata é a de Aracaju (SE), onde o custo é de R$ 515,51. A cesta básica é composta por 13 produtos alimentícios com os prescritos em decreto lei em 1938. Na ocasião, a justificativa era que tais produtos garantiriam, no período de um mês, uma boa qualidade de vida para um trabalhador adulto. As estimativas do Dieese e do Observatório PUC-Campinas respeitam os hábitos alimentares locais e, por isso, analisam as previsões nas estimativas da região Sudeste do Brasil. São eles: Açúcar: 3 kg Arroz: 3 kg Café: 600g Farinha: 1,5kg Feijão: 4,5kg Leite: 7,5 litros Manteiga: 750g Óleo: 750ml Banana: 90 unidades Batata: 6kg Carne: 6kg Pão francês: 6kg Tomate: 9kg Como ajudar? Doações de alimentos podem ser feitas ao Bancada Solidária diariamente das 9h às 17h, no kartódromo do Parque do Taquaral. O projeto também atende pelo telefone (19) 9-8237-4474. As demais entidades forneceram à EPTV, afiliada da TV Globo, números de telefones para que os interessados ​​em fazer doações possam entrar em contato. São eles: ONG Grupo Primavera: (19) 3746-7990 Ana Paula Fernandes, líder comunitária do Jardim Rosália: (19) 9-8771-5354 VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região Veja mais notícias da região no g1 Campinas.

Fonte G1

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