O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um inquérito, na noite da última segunda-feira (30/1), sobre a declaração do governador de Roraima, Antonio Denarium (Progressistas), sobre o povo Yanomami.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, Denarium afirmou que os indígenas devem “se aculturar” e não “podem ficar mais no meio da mata, parecendo bicho”. Segundo o MPF, as falas do governador do estado – onde figura a crise humanitária do povo Yanomami – são discriminatórias.
Ao ser questionado a respeito dos projetos que o estado mantém na terra indígena, Denarium respondeu: “Tenho 260 escolas em comunidades. Eles querem ser advogados, professores, médicos. Eu acho correto. Eles [indígenas] têm que se aculturar, não podem mais ficar no meio da mata, parecendo bicho. Eles têm que estar lá com condição, com estrada, escola, posto de saúde, fazendo-os agrícolas, produzindo macaxeira, farinha”.
De acordo com o procurador Alisson Marugal, as falas do governador “além de ofender a imagem coletiva dos Yanomami, rotulando-os como ‘bichos’, expressam opinião depreciativa que implica, ao que parece, a conclusão de que os povos indígenas não podem viver seu modo de vida tradicional.”
“As declarações do governador do estado de Roraima aparentemente negam o direito à existência do modo de vida tradicional Yanomami”, diz trecho do documento. “A manifestação preconceituosa concretiza-se com ofensas ou humilhações que importam menoscabo, ultraje ou vilipêndio, valendo-se de expressões linguísticas depreciativas inspiradas na etnia”.
Denarium pode ser responsabilizado nas esferas cívicas e criminosas. As falas podem configurar o crime previsto no art. 20 da Lei sobre Crimes de Preconceito de Raça ou de Cor. A pena é de reclusão de um a três anos e multa.
Para a Associação Hutukara Yanomami, organização representativa do grupo indígena, o governador é “cúmplice” da crise humanitária do povo Yanomami. “Falas desse tom denúncia o grau de reconhecimento e preconceitos a que o povo yanomami está inumanos. Nossos modos de vida nos são negados como se fôssemos primitivos, incapazes, inumanos”, escreveu em nota.
“É preciso repudiar com veemência a visão colonizadora sobre os povos indígenas do país que os reduzem a animais, incapazes, ou qualquer subcategoria de sujeitos excluídos de direitos que devam se submeter aos modos de vida da cidade”, declarou a assossiação.
Nota de repúdio da HUTUKARA associação Yanomami.
Sobre a fala do governador DENARIUM a folha de São Paulo. @antoniodenarium .. @JoeniaWapichana .. @GuajajaraSonia pic.twitter.com/0e9kfyP7VO— Dário Kopenawa Yanomami (@Dario_Kopenawa) 30 de janeiro de 2023
o outro lado
A assessoria de Denarium afirma ter recebido a citação com “estranheza”, uma vez que “as informações repassadas pelo governador foram tiradas do contexto na matéria veiculada”.
Segundo eles, o governador “não fez qualquer citação discriminatória em relação ao povo Yanomami”.
Leia a nota na íntegra:
A Secretaria de Comunicação do Governo de Roraima informa que recebeu com estranheza a citação, já que as informações repassadas pelo governador foram tiradas do contexto na matéria veiculada.
Em momento algum o governador fez qualquer citação discriminatória em relação ao povo Yanomami e desejo pela melhoria da vida das pessoas é o desejo de qualquer pessoa que valorize a propriedade de indígenas ou não.
O Governo do Estado reafirma o compromisso constitucional de atuar dentro da legalidade e trabalhando pelo desenvolvimento de Roraima e da sua gente.