Conheça a história do papa-lagarta-de-asa-vermelha; espécie migratória saído do Hemisfério Norte e viaja 15 mil milhas até o sudeste do Brasil; biólogo encontra indivíduo que se chocou com um “prédio espelhado” em Campinas. Papa-lagarta-de-asa-vermelha foi fotografado em Paulínia (SP) Fernando Godoy Depois de uma tarde chuvosa, as nuvens foram embora e a lua estampada no céu guiava os passos de um ornitólogo durante o trabalho de levantamento de fauna na cidade de Paulínia , interior de São Paulo. De repente, uma surpresa: o “choro” de uma ave invade a escuridão. “Eu escutei a ave vocalizando nesse horário, o que é bem incomum para espécies de hábitos diurnos. Porém, por ser uma ave migratória, ela também vocaliza no período noturno. Para ter certeza de que se tratou do bicho que imaginava, voltei a procurá-lo no outro dia”, explica o ornitólogo Fernando Godoy. Logo pela manhã, em um pequeno remanescente de floresta ao lado do canavial, o ornitólogo foi recompensado quando ouviu novamente o discreto estalar de bicos de uma ave migratória. “Foi um registro único para a cidade. Um momento incrível porque essa é uma das aves que conseguem voar por mais tempo, sem a necessidade de pousar”, conclui Godoy. Estudos apontam que o papa-lagarta-de-asa-vermelha (Coccyzus americanus), pode percorrer mais de 15 mil milhas por ano. Mas, por que fazer uma viagem tão longa assim? As estações do ano “explicam”. A espécie nativa do Hemisfério Norte, está presente no Brasil entre os meses de outubro e abril. Com a chegada do outono no Hemisfério Sul, a ave migra principalmente para os Estados Unidos e Caribe para se reproduzir durante a primavera. O Terra da Gente mostrou esse registro feito em Paulínia e na época repercutiu o assunto com outros observadores entusiastas da descoberta. “A presença dessa espécie comprova a importância de áreas verdes dentro dos municípios. As aves migratórias fazem essas viagens e param nesses pontos para se alimentar. Quanto mais áreas verdes essas aves encontram nesse trajeto, mais energia elas vão ter para concluir esse percurso naturalmente”, explicou o biólogo e guia de observação de aves, Jefferson Otaviano, que até então, nunca tinha visto o papa-lagarta-de-asa -vermelha. Ave foi encontrado sem vida após colisão com prédio em Campinas (SP) Jefferson Otaviano O primeiro encontro não foi como se esperava Semanas depois de ter sido entrevistado pelo TG, Jefferson ainda mantinha a esperança de encontrar a ave em algum parque urbano antes da voltar espécie para se tocar no Hemisfério Norte. O guia de observação de aves só não imaginava como esse encontro seria decepcionante. “Eu costumo levar meus cachorros para passear pelo bairro onde moro aqui em Campinas e quando passei em frente a um prédio com uma fachada de vidro, notei uma ave morta no chão. Pelo tamanho da cauda e das asas, percebi na hora que era uma espécie diferente”, explica Jefferson Otaviano. O biólogo acompanhou a ave e com ajuda de outros colegas fez a identificação da espécie. Infelizmente era o papa-lagarta-de-asa-vermelha. “Eu encontrei a avenida ao lado de uma porta de vidro. Tenho certeza que ela se confundiu com o reflexo das árvores e do capim que têm em frente ao imóvel. provavelmente o bicho voou em direção a esse reflexo e bateu na vidraça”, analisa Jefferson. Papa-lagarta-de-asa-vermelha é ave migratória que pode percorrer 15 mil milhas horárias Trent R. Stanley Luzes e vidraças confundem aves que se orientam pelas “estrelas” As colisões de aves com vidraças em áreas urbanas aumentam por causa do período de migrações. Muitas espécies que viajam longas distâncias, como por exemplo, o papa-lagarta-de-asa-vermelha, voam longos trajetos durante a noite guiando-se pela luminosidade das estrelas. Quando passa por uma cidade, essa ave migratória pode ser atraída por luzes artificiais e ao perder o rumo dessa trajetória de migração, fatalmente pode colidir contra vidraças ou paredes iluminadas. “É importante que as pessoas evitem deixar as luzes acesas continuamente em lugares sem uso. Isso evita a morte dessas aves migratórias”, afirma o biólogo Luciano Lima. Acredita-se que a segunda maior causa de mortalidade de aves no mundo, seja por causa de colisões que provocam fraturas no crânio, lesões nos bicos e olhos. A Organização Norte Americana para Conservação das Aves, American Bird Conservancy, estima que cada residência nos Estados Unidos provoca a morte de duas aves por ano, o que representa bilhões de aves envolvidas em colisões. Menos luzes e vidraças, que a arquitetura se renova, assim, como a esperança dos observadores de aves se renova para a próxima estação migratória. A expectativa é que o segundo “encontro” com a espécie, seja bem mais tranquilo. “Ainda quero ver essa ave voando por aqui. Nada é por acaso, que essa história nos ajuda a enxergar os afetos negativos que provocamos na natureza e como podemos nos tornar pessoas melhores”, completa o guia Jefferson Otaviano.
Fonte G1