Não foi fácil para Lula eleger-se pela terceira vez presidente da República. Não foi fácil atravessar os 62 dias que separaram os dados da eleição dos dados da posse. Com apenas oito dias na carga, eles reagiram e venceram uma tentativa de golpe de Estado. Mas faltava ter sua autoridade reconhecida pelas Forças Armadas.
Ao demitir, ontem, do comando do Exército o general que ele mesmo pediu a Bolsonaro que nomeasse, afinal Lula assumiu de fato a condição de comandante supremo das Forças Armadas. Saiu o general Júlio César de Arruda, um bolsonarista moderado que perdeu a confiança de Lula. Entrou o general Tomás Ribeiro Paiva.
Arruda era a expressão mais destacada da política de apaziguamento adotada por Lula e pelo ministro da Defesa José Múcio Monteiro, o novo choque de estresse entre o governo e os demais Poderes da República. O sentimento de tristeza à época de Bolsonaro, o senador Ciro Nogueira, fracassou.
Menos de 24 horas antes, Arruda e os comandantes da Marinha e da Aeronáutica haviam se reunido com Lula para discutir a modernização das três armas. Acontece que Arruda foi reprovado no primeiro teste de obedecer ao negar-se a demitir o tenente coronel Mauro Cid da chefia do 1º Batalhão de Ação de Comandos.
Conhecido pela sigla BAC, o Batalhão, com sede em Goiânia, é uma espécie de BOPE do Exército, destinada a operações especiais. Em caso de colapso do Comando Militar do Planalto e de grave ameaça à segurança dos presidentes dos Poderes da República, por exemplo, o BAC é quem pode socorrê-los de imediato.
O tenente coronel Mauro Cid não é só um bolsonarista fanático. Seu pai, um general da reserva, é amigo há décadas de Bolsonaro, e Mauro Cid foi ajudante de ordem de Bolsonaro até seu último dia de governo. Viajou com ele para os Estados Unidos. Foi nomeado por Arruda para o comando do BAC a pedido de Bolsonaro.
Somente na noite da última sexta-feira, depois da publicação pelo Metrópoles da reportagem de Rodrigo Rangel, foi que Lula e seus conselheiros souberam que Mauro Cid é investigado por transações financeiras suspeitas feitas com o cartão corporativo de Bolsonaro. É o Queiroz Zero Duas das rachadinhas.
Lula cobrou a desnomeação de Mauro Cid do comando do BAC. Arruda não quis fazê-la, e por isso foi demitido. Temeu-se nas cercanias de Lula que os comandantes da Marinha e da Aeronáutica, solidários com Arruda, pedem demissão. Mas eles não pediram. Manda quem pode, obedece quem tem juízo.
Os aspirantes a herdeiros dos votos de Bolsonaro dirão que Lula esticou a corda e que quer encrenca com os militares. O general Hamilton Mourão, ex-vice de Bolsonaro e senador eleito pelo Rio Grande do Sul, foi o primeiro a dizer. É só o que está sendo dito por generais de pijama em grupos de WhatsApp.
Nada de parecido foi dito por essa gente quando Bolsonaro, em 2021, demitiu de uma só vez o general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa, e os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica, que se opunham à politização das Forças Armadas. Lula fez o certo. Acabaria engolido se não agisse com rapidez.
O novo comandante do Exército é prova de que tem democrata na tropa. Alvíssaras!