Saiu, nesta quarta-feira (4), o primeiro episódio de “O Ateliê”, novo podcast de Chico Felitti, responsável pelo sucesso “A Mulher da Casa Abandonada”. Em sua nova empreitada, o jornalista conta a história de um grupo de ex-alunos de uma escola de artes paulista, que afirma ter sofrido abusos psicológicos, físicos, sexuais e financeiros no local, com a participação de uma espécie de seita.
No primeiro dos dez capítulos do podcast, Felitti comenta sobre o início de suas discussões. Na ocasião, ele acompanhou Mirela Cabral, única testemunha que permitiu que seu nome fosse veiculado na imprensa, enquanto ela ia à delegacia denunciar os supostos crimes do Atelier do Centro. Na Justiça, a artista acusa Rubens Espírito Santo, dono da escola, de abuso. Segundo Mirela, ela não teria sido a única vítima do profissional. Outras duas mulheres também foram com ela denunciá-lo.
Cabral entrou no ateliê aos 24 anos, quando trabalhava para uma empresa audiovisual. Na época, o dono da escola foi caracterizado por ela como “meio gênio e meio excêntrico“. Mirela frequentou o lugar, originalmente, para fazer um documentário, acabou se encantando pelo charme e ficou para estudar.
Já de início, ela se demitiu de seu então trabalho e passou a obedecer regras restritas de Rubens – que era chamado de ‘mestre’ por todos – sobre horários para acordar, dormir e se alimentar. Logo depois de se tornar uma discípula – como ela mesmo se define -, Mirela cortou relações com as pessoas de fora do centro de estudos. Segundo a baiana, Rubens usava o dinheiro dela para comprar coisas, além de usar seu carro para ir ao médico. O relacionamento intercedeu com o professor, no entanto, logo teria escalado para agressões físicas.
“Eu lembro exatamente do primeiro ato vigoroso físico, né? Antes já começava nas palavras, psicológicas. Ele puxou meu cabelo de um jeito que eu quase caí da cadeira, todo mundo olhou como se fosse normal. Ao mesmo tempo que eu estava chorando, eu me perguntei: ‘bom, isso é parte desse rolê? Será que eu preciso passar por isso?’. Eu não entendi, eu tava machucada, mas todos que estavam à minha volta estavam ali sem fazer nada, então eu meio que absorvi isso, eu queria fazer parte de algo“, afirmou.
Segundo a pintora, todos os alunos estavam ansiosos pelos ataques de Rubens. “Se você chegava atrasado, ele podia mandar você lavar a cabeça no tanque, ou lavar a cabeça no tanque enquanto ele puxava seu cabelo, ou jogar um balde de água fria do nada sem você ver, ou pedir para alguém fazer isso. (…) Era uma coisa muito da rotina e todo mundo já tava anestesiado, todo mundo já via isso como algo totalmente normalizado“, lembra.
Felitti, então, revelou que muitos dos supostos abusos foram documentados, e que ele mesmo teve acesso a “horas” de vídeos demonstrando o comportamento agressivo do professor. O jornalista também teve acesso a e-mails em que o Espírito Santo chamou uma aluna de “p*ta burra“.
Depois de anos no local, Mirela rompeu com a instituição após ser internada com um problema de coração. Segundo ela, desde então, sua maneira de fazer arte mudou. Ainda assim, até hoje ela lida com resquícios da época em que estava no que definir como “uma seita“. “Nos primeiros dois anos, quase todos os dias eu sonhava com o ateliê“, afirmou. Confira o primeiro episódio completo:
Resposta da instituição
O Atelier do Centro se pronunciou no mesmo dia em que Chico anunciou o podcast, na terça-feira (3). Pelas redes sociais, a escola fortemente rejeitada como rejeitada, classificada como “fantasias“.
“A peça, em tom sensacionalista, acusa a instituição de ser uma seita baseada em violência psicológica e física, e de explorar economicamente os alunos. Nada mais distante da realidade. O Conglomerado Atelier do Centro é uma escola de arte, fundada há mais de 20 anos, no centro de São Paulo, pelo artista Rubens Espírito Santo. A instituição oferece cursos de arte, filosofia, performances e um programa de acompanhamento, formação e pesquisa continuada”, declarado.
“A escola é aberta ao público e os participantes pagam mensalidades para a manutenção dos programas de formação. Todos os alunos são maiores de idade, a maior parte deles têm formação universitária, e participam livremente das atividades propostas, que são realizadas de forma coletiva e consensual”. detalhou o atelier.
“No teaser do podcast, o autor procura criar um clima de mistério inexistente e traçar uma analogia grave e absurda com seitas como a do Templo do Povo, que culminou no trágico suicídio em massa na Guiana, em 1978. A ilação é infundada, criminosa e ingressa no mundo das fake news para atrair ouvintes, o que lamentamos profundamente”, reclamou o texto.
O comunicado, então, relembrou a única visita que o jornalista fez ao local, em dezembro do ano passado. “Importante registrar que Chico Felitti não teve a curiosidade e responsabilidade investigativa de conhecer o Conglomerado Atelier do centro, participou ativamente das experiências artístico-pedagógicas, apesar de ter sido convidado a fazê-lo. O podcaster esteve na escola em 16 de dezembro de 2022, sem agendamento prévio, solicitando uma conversa com Rubens Espírito Santo, que o recebeu recebido e de forma acolhedora, sem qualquer ressalva em conceder uma entrevista gravada – em que trechos provavelmente são usados no programa . Chico não informou o teor de sua pauta no contato inicial, restringindo o conhecimento da fonte sobre o conteúdo a ser tratado no encontro”, relatou a instituição.
“O Conglomerado Atelier do Centro participou da formação de mais de uma centena de artistas e outros profissionais na sua longa e exitosa existência. Em relações desta natureza, sempre haverá divergências. Muitos desses alunos perderam a escola e fizeram sem nenhum constrangimento, como ocorre com frequência em outras instituições de formação, quando desaparecem os elos de conexão e recusam. Nada que justifique as emoções infundadas recebidas em ‘O Ateliê’“, concluiu. Veja:
Nesta quarta-feira (4), a Folha de São Paulo divulgou uma parte da conversa entre Chico e Rubens. No trecho, o artista alega que tudo que aconteceu na instituição foi “consentido” e entre maiores de idade: “Eu não fiz nada que alguém maior de 20 anos não estivesse completamente condizente. Cara, vamos supor que você queira que eu proponha pra você agora: ‘Ô, Chico, posso colocar cinco brincos no seu ouvido?’. É crime isso? Se você permitir, se você falar que pode, é crime?“.
siga o Hugo Gloss no Google Notícias e acompanhe nossas notícias!