Corte de verbas na educação (por Cristovam Buarque)

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Nos tristes estertores finais de seu governo, que serão tema de historiadores e escritores, o governo Bolsonaro comete mais um crime: corte de verbas para as universidades e escolas técnicas. Mesmo que volte atrás e reponha os recursos, a concentração desestrutura pesquisas, cursos, desorganiza administrações e abala o ânimo dos professores, alunos e pesquisador: é um crime.

Mas serve para mostrar um equilíbrio estrutural do sistema educacional brasileiro: o presidente, seu ministro da educação, a União cuidam do ensino superior e das escolas técnicas, sem responsabilidade, nem cuidado, com a educação de base de 50 milhões de crianças em idade escolar . Todos os anos e meses, milhares entre os quase seis mil prefeitos ficam incapacitados de gastar o necessário com suas escolas municipais, mas o Brasil simplesmente ignora quando eles cortam gastos, até mesmo quando atrasam ingressos de professores. Até hoje, raras prefeituras conseguem pagar o pequeno salário definido pela lei nacional do Piso Salarial do Professor. Entre os estados, o governo do Rio Grande Norte é dos poucos que compreende o Piso inclusive para os aposentados.

A União fez a Lei do Piso em 2008, mas não assumiu a responsabilidade com o cumprimento do pagamento aos professores, porque são servidores municipais. O Brasil felizmente se preocupa com os gastos com as universidades e com as escolas técnicas federais, sem preocupação com os gastos limitados nas escolas municipais onde estudam nossas crianças. O Brasil não dará um salto na educação de base enquanto preocupação com o ensino superior para o federal e com a educação de base para o municipal; enquanto os universitários são responsabilidade do presidente, e os alunos de base são responsabilidade de seus prefeitos.

É como se o Ministério da Saúde cuidasse dos grandes hospitais e em cada estado e cada município as Secretarias da Saúde cuidassem das vacinas, do saneamento, do SUS. As escolas continuarão sem recursos suficientes e a qualidade das escolas será desigual. O futuro da criança continuará dependendo da renda de seus pais e do endereço onde mora, para usar a receita de seu município e as prioridades de seu prefeito.

Sem um sistema nacional de educação sob responsabilidade do governo federal continuaremos perdendo os cérebros de dezenas de milhões de crianças, simplesmente por causa da cidade onde vivem.

Para mudar isto e tratar cada criança como questão nacional, além de uma mudança geral na maternidade brasileira em promover a educação de base, será preciso ter um ministério responsável por este setor educacional, e iniciar uma estratégia de adoção das escolas de base pelo governo federal , nos municípios sem condições de oferecer escola de qualidade a suas crianças. Isto vem sendo defendido por alguns, desde 2002, antes do início do primeiro governo Lula, mas poucos aceitam a sugestão, sem apresentar argumentos contrários convincentes.

Por que os estados têm suas universidades, USP, UNESP, Unicamp nas secretarias de ciência e tecnologia, muitos países também têm esta estrutura, mas o Brasil não pode ter sua educação de base em um ministério próprio: o MEC com a educação dos 50 milhões de crianças que representam o futuro do Brasil? Sacrificando o próprio ensino superior que hoje recebe alunos sem o preparo necessário para seguirem as carreiras que o governo federal lhes dá depois de haverem-lhes negado a educação de base necessária.

Cristovam Buarque foi governador, senador e ministro

Fonte Metropoles

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